quarta-feira, 6 de abril de 2011

OS MUITOS RICARDOS (III)


Cristiane Smith


Na versão fílmica de Ricardo III (1995), o ator inglês Ian Mckellen (popularmente conhecido como Dumbledore do filme Harry Potter) é o ambicioso e carismático protagonista. Adaptada para a década de trinta, numa Londres com tons fascistas, o filme nos lembra o quão contemporâneo os temas da cobiça, da usurpação do trono, da corrupção e da fragilidade humana podem ser. Ainda que Ricardo III não possua um átomo de bondade na sua constituição, nos surpreendemos com sua impressionante eloquência e carisma, que já se manifestam desde o famoso monólogo "This is the winter of our discontent" / "Este é o inverno do nosso descontentamento" (I.i) que abre a peça:


Abaixo, uma versão cômica de Ricardo III com Peter Sellers nos mostrando a flexibilidade do texto shakespeariano ao empregar a letra da música dos Beatles "It's been a hard day's night" para o contexto da peça.




Já o excelente filme Looking for Richard (1996) (Ricardo III - um ensaio) com Al Pacino narra a trajetória de um ator norte-americano que enfrenta o desafio de interpretar Ricardo III. Ao meio de entrevistas sobre Shakespeare com professores de literatura e pessoas na rua, bem como ensaios nos quais assistimos Al Pacino pouco a pouco encarnar Ricardo III, há uma verdadeira reflexão sobre a pertinência de Shakespeare na cultura contemporânea.



Por fim, o encantador sotaque brasileiro de Ricardo III na peça Sua Incelença, Ricardo III da trupe Clowns de Shakespeare, apresentado no Festival de Teatro de Curitiba nos dias 30 e 31 de março. Com claras inflexões da cultura popular nordestina situadas na estética barroca, marca-registrada da carreira do encenador Gabriel Villela, Shakespeare é levado à rua num picadeiro de circo a partir de três carroças, num cenário colorido e onírico. A trilha sonora escolhida para embalar o enredo de intrigas e assassinatos de Ricardo III,  mescla as “incelenças”, gênero musical tipicamente nordestino, com baladas do rock’n roll inglês de Queen e Supertramp. Dissonantes? Não no contexto circense que não apenas comporta mas também dá as boas-vindas à presença de elementos aparentemente desiguais da “alta” cultura e da cultura popular.

Assim como os exemplos acima, Sua Incelença, Ricardo III, nos mostra com poesia e grande competência, como uma das maneiras mais produtivas de se representar Shakespeare no teatro moderno é destacar o quanto o texto do  grande dramaturgo inglês é popular e contemporâneo.







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