segunda-feira, 11 de abril de 2011

A HISTÓRIA E OS MEIOS ACOMODADOS


 
Eunice de Morais.

O sábio tem domínio da influência
Celeste; e na potência da vontade.
E se o fim não alcança desejado
é por não ser o meio acomodado.

Bento Teixeira
  
 
Observar a produção do romance histórico contemporâneo pode ser surpreendente tanto pelos novíssimos modos e estratégias da construção discursiva quanto pela tentativa de manutenção ou de recuperação de recursos narrativos do romance histórico do século XIX.
O romance O primeiro brasileiro (1995), de Gilberto Vilar, merece maior atenção e análise por dois motivos: a importante revisão histórica que faz sobre a figura de Bento Teixeira e sobre a Inquisição no Brasil, em seu primeiro século de colonização; e pelo modo como reapresenta este assunto na forma de biografia romanceada, utilizando-se de recursos narrativos como paratextos, citações e apropriações estilísticas os quais ora recuperam ideais do Romance Histórico Romântico[1], ora tentam uma aproximação com recursos e estratégias discursivas que têm sido freqüentemente utilizados por um tipo de ficção histórica denominada pós-moderna.
O romance trata da vida de uma personagem da história da literatura brasileira e acaba por fazer críticas mais às condições políticas e sociais em que vivia a população do que ao modo como a historiografia apresenta esta personagem. A falta de revisão historiográfica sobre o tema é lembrada em notas finais e a narrativa ficcional parece confirmar seu caráter revisionista quando, mais uma vez, apresenta Bento Teixeira como o primeiro poeta brasileiro a ter sua obra publicada em Portugal, reafirmando que a importância desta obra, a Prosopopéia, de 1601, para a literatura brasileira, permanece justificada por ter sido a primeira obra produzida no Brasil por um poeta brasileiro. Enfim, não há revisitação histórica ou um olhar questionador sobre o histórico. Esse romance, que se fosse romântico não ensaiaria uma focalização narrativa variável, também não é pós-moderno por faltar-lhe o caráter reflexivo e questionador sobre a construção da história.
Observamos desde já que esta ambigüidade ou dicotomia parece ser prejudicial à realização da obra enquanto construção romanesca, já que a maior preocupação do autor relaciona-se com a fidelidade à pesquisa documental, como procuraremos demonstrar adiante. Assim, o que propomos como foco de análise é a relação entre os recursos narrativos utilizados, o modo de construção do romance e a percepção histórica demonstrada pela voz autoral, observando a eficiência e o significado da utilização destes instrumentos.


[1]  O Romance Histórico Romântico será identificado aqui com a produção de Walter Scott e definido por George Luckács em La novela histórica (1971), lançado em 1937.

O fragmento acima é parte do artigo escrito pela prof.ª Eunice de Morais, publicado na obra Ficção histórica: teoria e crítica, organizado pela prof. Marilene Weinhardt (UFPR) e publicado pela Editora UEPG.

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